top of page

O princípio da Austeridade

  • Foto do escritor: Notícias
    Notícias
  • 12 de fev.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 25 de fev.

Murilo José de Souza Pires, do PSOL-Goiânia, é Doutor pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas - IE/UNICAMP.

O contexto que atualmente marca a relação entre o capital e o trabalho tem como linha mestra a ideologia do neoliberalismo. Nesse sentido, a ideia força é que os mercados autorreguladores possuem a capacidade de impulsionar por si mesmos os determinantes dos investimentos e, com isso, conduz as economias pelos trilhos do desenvolvimento econômico e, por conseguinte da riqueza nacional.


A ideia central do argumento é que o Estado Mínimo, ao se desvencilhar das amarras impostas pelo Leviatã, liberta o espírito empreendedor dos empresários e, com isso, os conduz para a Nova Canaã. Assim, os mercados livres nos trazem verdades bíblicas, como mencionado em Deuteronômio 26:9: "E nos trouxe a este lugar, e nos deu esta terra, terra que mana leite e mel".


Para alcançar o objetivo da Nova Canaã, é significativo seguir algumas lições, considerando que chegamos ao "Fim da História e o Último Homem", conforme discutido por Francis Fukuyama. O capitalismo prevaleceu, e os princípios do Neoliberalismo tornaram-se uma verdade universal. Não há outra trilha a seguir, especialmente para os países da região Sul-Sul, como a América Latina, onde a economia norte-americana serve como farol orientador.


Nesse contexto, os governantes dessas economias devem adotar alguns princípios fundamentais. O primeiro deles é a austeridade fiscal, monetária e industrial. Para alcançar a austeridade fiscal, os governos precisam realizar cortes profundos nos orçamentos públicos, especialmente nas áreas que atendem às demandas sociais, como educação, saúde, previdência e assistência social. O objetivo é manter os orçamentos equilibrados, garantindo que as despesas não superem as receitas. Os defensores do neoliberalismo argumentam que o Estado deve assumir apenas funções e despesas que protejam a propriedade privada e a liberdade contratual.


No caso da austeridade monetária, o objetivo é regular a quantidade de liquidez e crédito na economia, de modo a evitar desequilíbrios entre oferta e demanda monetária. Para isso, é importante manter uma taxa de juros real positiva e elevada, bem como reduzir significativamente a expansão do crédito. Essa redução tem como finalidade influenciar as decisões de investimento e os gastos correntes das famílias.


Em relação à austeridade industrial, o objetivo é acelerar os programas de privatizações para transferir os ativos públicos para a iniciativa privada. Ou seja, o Estado não deve exercer nenhuma atividade produtiva, pois isso é uma atribuição da iniciativa privada. Além disso, o Estado deve incentivar as demissões de funcionários públicos, reprimir greves e formações de sindicatos, e especialmente impulsionar as reduções salariais dos servidores públicos.


Mas, ao fim e ao cabo, qual o significado desta trindade de austeridade para a classe trabalhadora? Primeiramente, são propostas que despolitizam o debate da política pública fiscal, monetária e industrial nos países. Isso significa que a alocação dos recursos públicos, por meio do orçamento do governo, é atribuição de tecnocratas apolíticos que não apresentam nenhuma sensibilidade para os problemas de uma sociedade subdesenvolvida, a qual carrega sérios contrastes sociais e econômicos em sua natureza.


Quer dizer, um país que apresenta sérios problemas econômicos e sociais, os quais não garantem pleno acesso a classe trabalhadora a educação, saúde, habitação, transporte público etc. Para os tecnocratas, o objetivo é estimular o darwinismo social de Herbert Spencer, contemplando poucos que acessam a riqueza (renda e patrimônio) da sociedade em detrimento de uma grande maioria que vive marginalizada e sem amparo do Estado. Ou seja, ampliar e amplificar ainda mais o abismo existente entre os ricos e pobres na sociedade.


Além disso, as políticas fiscais e monetárias restritivas têm por objetivo desacelerar o ritmo de crescimento da economia, reduzindo o número de postos de trabalho e, consequentemente, o rendimento nominal e real do trabalhador. Em um ambiente onde os sindicatos são desmantelados e há repressão às greves, observa-se uma desarticulação profunda da classe trabalhadora. O resultado de tudo isso é o atrofiamento da massa salarial e, consequentemente, do consumo dos trabalhadores.


Sendo assim, o ambiente para a classe trabalhadora é marcado por desemprego, perda de poder de compra do salário, redução da capacidade de consumo e desarticulação de seus órgãos de representação. Tudo isso tem um objetivo para os neoliberais: Controlar o espírito de organização da classe trabalhadora, impedindo que se constituam como uma classe social.


Com o consumo em queda e os salários atingindo níveis de subsistência, a classe dos capitalistas vê seus lucros aumentarem significativamente. Isso contribui para acelerar o processo de concentração de renda na elite nacional, resultando em uma disparidade crescente entre os ricos e os pobres. Essa dinâmica ocorre porque o excedente gerado pela contração do mercado interno é direcionado para atender à demanda dos mercados internacionais.


Além disso, é considerável ressaltar que o argumento da privatização também é uma falácia. Privatizar não é sinônimo de redução da corrupção. A privatização carrega um simbolismo que deve ser questionado, pois o Estado entrega ativos construídos por todos nós para a iniciativa privada. Esses ativos desempenham um papel social relevante, especialmente ao estimular investimentos em setores e regiões nos quais o capital privado não tem interesse em participar. Sem esses investimentos estatais, muitas pessoas à margem da sociedade não teriam condições de se integrar plenamente à sociedade.


Por fim, gostaria de destacar outras duas falácias frequentemente apresentadas pelo discurso neoliberal. Primeiramente, a redução das despesas com políticas públicas para equilibrar o orçamento visa gerar um excedente orçamentário primário que, infelizmente, é frequentemente canalizado para pagar os rentistas que emprestam dinheiro ao Estado a juros estratosféricos. Os recursos retirados da educação, saúde e outros programas sociais acabam sendo direcionados cada vez mais para o pagamento de juros a uma elite que vive de rendas estatais.


Diante desse cenário, é valoroso os partidos políticos de esquerda aprofundem seus diagnósticos sobre os impactos que a austeridade fiscal, monetária e industrial tem na vida da classe trabalhadora. Para tanto, é relevante resgatar e reafirmar que a luta de classe deve ser o motor que alimenta suas propostas políticas. Não é por meio de paliativos ou, então, por concessões ao capital que as pautas da classe trabalhadora irão melhorar a posição relativa do trabalhador na sociedade. As transformações das condições de vida da classe trabalhadora somente se cristalizarão quando os partidos políticos de esquerda tiverem um projeto alternativo de sociedade que possa colocar o trabalhador como centro da transformação social, econômica e política.

コメント

5つ星のうち0と評価されています。
まだ評価がありません

評価を追加

Receba nossas atualizações

Obrigado pelo envio!

  • Instagram

ACESSE NOSSO INSTAGRAM

bottom of page